Blog

Desporto

A Influência do Movimento na Dor

A Influência do Movimento na Dor

IMPLICAÇÕES DO EXERCICIO TERAPEUTICO NA DOR MUSCULO-ESQUELETICA CRONICA

INTRODUÇÃO

A dor, além de gerar stresse físico e emocional, provoca perdas para os doentes e seus cuidadores, sendo razão do aumento de gastos monetários para a sociedade.

A dor pode ser dividida em: dor neuropática – quando ocorre alguma lesão de tecido neural, dor nociceptiva– quando há lesão de tecido e estimula os mecanismos da dor e dor nociplastica – quando não há dano de tecido, logo não há ativação dos mecanismos da dor e a dor existe, aqui o mecanismo envolvido é a sensibilização central.

A sensibilização central ocorre quando o corpo habituado a ter dor, começa a ter a percepção que qualquer movimento provoca dor, dá-se por isso, um aumento da sensibilidade á dor.

A dor pode-se caracterizar em dor aguda ou crónica. A dor aguda é uma dor recente, que apareceu à menos de 3 meses e que pode persistir entre 3 a 6 meses. A dor crónica é uma dor prolongada no tempo, com padrões e comportamentos atípicos, localizada uni ou bilateralmente. Pode atingir o indivíduo, família, rede social e estilo de vida. A ocorrência de dor crónica é cada vez maior, devido á existência de novos hábitos de vida e maior longevidade.

A dor músculo-esquelética crónica refere-se à dor sentida nos ossos, articulações e tecido muscular que persiste por mais de 3 a 6 meses. Este tipo de dor é a maior causa de dificuldade na sociedade ocidental que em 2012 afetava cerca de 20% dos adultos e estima-se que em 2050 seja acima dos 50%.

Com o evoluir da dor, o sistema de transmissão da dor- via nociceptiva- e os mecanismos que sustentam a própria dor, tornam-se mais sensíveis. A relação entre dor e a verdadeira necessidade de proteger o tecido corporal torna-se mais ténue e a contribuição para a dor por fatores biopsicossociais pode aumentar. O exercício físico como intervenção para a dor crónica músculo-esquelética parece ter efeitos a nível da diminuição dos sintomas da dor.

Tratamento biopsicossocial que reconhece e tem como objetivo abordar os fatores físicos, psicológicos e sociais adjacentes, dor e incapacidade são atualmente aceites como mais eficazes na abordagem da dor crónica.

Existem, entretanto, várias barreiras teóricas e metodológicas que limitam a investigação epidemiológica sobre a dor. Grande parte das dificuldades é fundamentada na natureza complexa da dor que apresenta numerosos aspetos fisiopatológicos, interacções psicológicas e sociais e grande diversidade de apresentações e de fatores causais.


A DOR E O EXERCÍCIO

Os estudos sobre a epidemiologia da dor são complexos e imprecisos devido á heterogeneidade, quanto á apresentação das condições causais e sintomáticas, variações sazonais e regionais e á ausência de padronização dos critérios para a classificação dos problemas álgicos. A dor é indicada como uma “experiência sensorial e emocional desagradável associada à lesão tecidual real ou potencial ou descrita em termos de tal dano.

É amplamente aceite que o aumento dos níveis de atividade física beneficia indivíduos com dor crónica músculo-esquelética. Exercício físico como modalidade terapêutica para melhorar a dor e a incapacidade física tem sido amplamente investigada usando ensaios clínicos randomizados. Revisões sistémicas de ensaios clínicos randomizados demonstram que o exercício físico aeróbio e resistido eram mais eficaz do que outro tipo de intervenção para melhorar a função física e a dor na fibromialgia, osteoartrite do joelho e dor lombar.

Primeiro temos que perceber e compreender os mecanismos da dor e o processamento nociceptivo central em pacientes com dor músculo-esquelética crónica. Isso inclui uma compreensão completa do papel do “medo do movimento” (cinesiofobia), no desenvolvimento e manutenção da dor crónica. É necessário ter conhecimento, acerca dos mecanismos de sensibilização central, para explicar aos pacientes.

Devemos ter conhecimentos concretos para aplicar uma variedade de intervenções de exercícios. E ter conhecimentos para basear as técnicas em evidência da neurociência moderna da dor. Não podemos deixar que os pacientes pensem que a dor está na sua cabeça, isto é uma armadilha comum na abordagem á dor crónica.

A cinesiofobia ou medo do movimento é aplicável a todos os tipos de atividade física, mas aplica-se a certos movimentos. O cérebro tem necessidade de uma memória dolorosa de longo prazo, associando tais movimentos com perigo\ameaça. Mesmo estando preparado para tais movimentos perigosos é suficiente para o cérebro ativar o seu centro de memória do medo, e portanto, produzir dor (sem nociceção) e empregar uma estratégia de controlo motor alterada.

Os pacientes que não entendam o que se pretende com a neurofisiologia da dor consideram a sua situação mais ameaçadora, e com isso apresentam menor tolerância á dor. A combinação de todos esses fatores contribui para a manutenção do estado de dor crónica e maior limitação das atividades.

Se o tratamento primário de um paciente é a redução da dor e esta não acontece, pode fazer com que os níveis de ansiedade aumentem e contribuam assim para o aumento da dor e incapacidade. Isto pode ser evitado se não aumentarmos as espectativas em relação á melhoria da função, qualidade de vida e redução da dor no dia-a-dia – isto não quer dizer que o paciente não espere melhorias da dor com o exercício físico. Uma abordagem melhor é que o alívio da dor se torne um objetivo secundário.

A definição de metas deve ser concluída antes de iniciar o exercício e envolve uma abordagem colaborativa com o fisioterapeuta, em que ajuda o paciente a identificar objetivos significativos, não apenas relacionados com o exercício, atividade física e função, mas também com os aspetos biopsicossociais. O objetivo do tratamento deve ser centrado no paciente!

A dor altera o movimento e os pacientes com dor músculo-esquelética, geralmente apresentam padrões anormais de movimento. Um dos objetivos principais é restaurar o movimento.

Programas combinados de exercícios que consistem em exercícios aeróbios, exercícios de fortalecimento muscular e alongamentos realizados 45 a 60 min., 2 ou 3 vezes por semana durante 3 a 6 meses, além de ajudar na diminuição da dor músculo-esquelética, é também eficazes na redução dos sintomas de depressão.

Os benefícios do treino aeróbio incluem também melhoria do bem-estar psicológico e melhoria da função cognitiva. O caminhar, andar de bicicleta, nadar têm o potencial de diminuir o volume da dor.

O exercício é benéfico para pessoas que sofrem de dor, contudo muitos pacientes têm que ser motivados.

A associação do exercício/movimento com dor e lesão pode aumentar a ansiedade e a dor. Um princípio orientador é que todos os exercícios e atividades sejam entendidos como seguros e com significado pelo paciente. É importante que os pacientes acreditem que é seguro fazer o exercício pedido. Os exercícios podem ser feitos segundo a tolerância do paciente e modificados segundo a tolerância.


CONCLUSÃO

Estabelecer uma boa relação entre terapeuta-paciente é o primeiro passo para que uma educação na dor com base na neurociência seja um sucesso.

Compreender a biologia contemporânea da dor e explicar que a dor são competências necessárias ao tratamento biopsicossocial, devemos informar o paciente que é seguro realizar os exercícios, apesar dos sintomas que poderá sentir. A prescrição do exercício deve ser adequada á dor do paciente e devemos ter respostas prontas para fases de crise, para conseguir reduzir a sintomatologia, estes são aspetos muito importantes para o sucesso no tratamento da dor crónica.

Devemos trabalhar o exercício físico em função do movimento e ou atividade que o paciente tem dificuldade e medo. Logo, o programa de exercícios deve ser adaptado á realidade e medos, isto é, á individualidade e especificidade do paciente.

Associar tratamentos de fisioterapia com o exercício físico é o caminho a adotar para a diminuição da dor crónica.


BIBLIOGRAFIA

Booth, J., Moseley, G. L., Schiltenwolf, M., Cashin, A., Davies, M., & Hübscher, M. (2017). Exercise for chronic musculoskeletal pain: A biopsychosocial approach. Musculoskeletal Care, 15(4), 413–421. https://doi.org/10.1002/msc.1191

Chimenti, R. L., Frey-Law, L. A., & Sluka, K. A. (2018). A mechanism-based approach to physical therapist management of pain. Physical Therapy, 98(5), 302–314. https://doi.org/10.1093/ptj/pzy030

Daenen, L., Varkey, E., Kellmann, M., & Nijs, J. (2015). Exercise, not to exercise, or how to exercise in patients with chronic pain? Applying science to practice. Clinical Journal of Pain, 31(2), 108–114. https://doi.org/10.1097/AJP.0000000000000099

Geneen, L. J., More, R. A., Clarke, C., Martin, D., Colvin, L. A., & Smith, B. H. (2017). Physical activity and exercise for chronic pain in adults. Journal of Sociology, (1), 135–139. https://doi.org/10.1002/14651858.CD011279.pub3.www.cochranelibrary.com

Gordon, R., & Bloxham, S. (2016). A Systematic Review of the Effects of Exercise and Physical Activity on Non-Specific Chronic Low Back Pain. Healthcare, 4(2), 22. https://doi.org/10.3390/healthcare4020022

Huysmans, E., Ickmans, K., Van Dyck, D., Nijs, J., Gidron, Y., Roussel, N., … De Kooning, M. (2018). Association Between Symptoms of Central Sensitization and Cognitive Behavioral Factors in People With Chronic Nonspecific Low Back Pain: A Cross-sectional Study. Journal of Manipulative and Physiological Therapeutics, 41(2), 92–101. https://doi.org/10.1016/j.jmpt.2017.08.007

IASP. (2017). International Association for the Study of Pain. Retrieved from https://www.iasp-pain.org/Education/Content.aspx?ItemNumber=1698&navItemNumber=576

Jordan, J. L., Holden, M. A., Mason, E. E., & Foster, N. E. (2010). Interventions to improve adherence to exercise for chronic musculoskeletal pain in adults. Cochrane Database of Systematic Reviews, (1). https://doi.org/10.1002/14651858.cd005956.pub2

Karlsson, L. (2017). Chronic pain and exercise.

Lima, L. V., Abner, T. S. S., & Sluka, K. A. (2017). Does exercise increase or decrease pain? Central mechanisms underlying these two phenomena. Journal of Physiology, 595(13), 4141–4150. https://doi.org/10.1113/JP273355

Meeus, M., & Nijs, J. (2007). Central sensitization: a biopsychosocial explanation for chronic widespread pain in  patients with fibromyalgia and chronic fatigue syndrome. Clinical Rheumatology, 26(4), 465–473. https://doi.org/10.1007/s10067-006-0433-9

Naugle, K. M., Fillingim, R. B., & Riley, J. L. (2012). A meta-analytic review of the hypoalgesic effects of exercise. Journal of Pain, 13(12), 1139–1150. https://doi.org/10.1016/j.jpain.2012.09.006

Nijs, J., Kosek, E., Oosterwijck, J. Van, & Meeus, M. (2012). Dysfunctional Endogenous Analgesia During Exercise in Patients with Chronic Pain: To Exercise or Not to Exercise? Pain Physician, (1), 205–214.

Nijs, J., Lluch Girbés, E., Lundberg, M., Malfliet, A., & Sterling, M. (2014). Exercise therapy for chronic musculoskeletal pain: Innovation by altering pain memories. Manual Therapy, 20(1), 216–220. https://doi.org/10.1016/j.math.2014.07.004

Oliveira, M. A. S., Fernandes, R. de S. C., & Daher, S. S. (2014). Impacto do exercício na dor crônica. Revista Brasileira de Medicina Do Esporte, 20(3), 200–203. https://doi.org/10.1590/1517-86922014200301415

Pardo, G. B., Girbés, E. L., Roussel, N. A., Izquierdo, T. G., Penick, V. J., & Martín, D. P. (2018). Pain Neurophysiology Education and Therapeutic Exercise for Patients With Chronic Low Back Pain: A Single-Blind Randomized Controlled Trial. Archives of Physical Medicine and Rehabilitation, 99(2), 338–347. https://doi.org/10.1016/j.apmr.2017.10.016

Rice, D., Nijs, J., Kosek, E., Wideman, T., Hasenbring, M. I., Koltyn, K., … Polli, A. (2019). Exercise-Induced Hypoalgesia in Pain-Free and Chronic Pain Populations: State of the Art and Future Directions. Journal of Pain, 20(11), 1249–1266. https://doi.org/10.1016/j.jpain.2019.03.005

Rodrigues, E. V., Gomes, A. R. S., Tanhoffer, A. I. P., & Leite, N. (2014). Effects of exercise on pain of musculoskeletal disorders: A systematic review. Acta Ortopedica Brasileira, 22(6), 334–338. https://doi.org/10.1590/1413-78522014220601004

Serrat, M., Sanabria-Mazo, J. P., García-Troiteiro, E., Fontcuberta, A., Mateo-Canedo, C., Almirall, M., … Luciano, J. V. (2020). Efficacy of a multicomponent intervention for fibromyalgia based on pain neuroscience education, exercise therapy, psychological support, and nature exposure (NAT-FM): Study protocol of a randomized controlled trial. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(2). https://doi.org/10.3390/ijerph17020634

Sluka, K. A., Frey-Law, L., & Hoeger Bement, M. (2018). Exercise-induced pain and analgesia? Underlying mechanisms and clinical translation. Pain, 159(Suppl 1), S91–S97. https://doi.org/10.1097/j.pain.0000000000001235

Smith, B. E., Hendrick, P., Bateman, M., Holden, S., Littlewood, C., Smith, T. O., & Logan, P. (2019). Musculoskeletal pain and exercise – Challenging existing paradigms and introducing new. British Journal of Sports Medicine, 53(14), 907–912. https://doi.org/10.1136/bjsports-2017-098983

Sosa-Reina, M. D., Nunez-Nagy, S., Gallego-Izquierdo, T., Pecos-Martín, D., Monserrat, J., & Álvarez-Mon, M. (2017). Effectiveness of Therapeutic Exercise in Fibromyalgia Syndrome: A Systematic Review and Meta-Analysis of Randomized Clinical Trials. BioMed Research International, 2017. https://doi.org/10.1155/2017/2356346

Souza, J. B. de. (2009). Poderia a atividade física induzir analgesia em pacientes com dor crônica? Revista Brasileira de Medicina Do Esporte, 15(2), 145–150. https://doi.org/10.1590/s1517-86922009000200013

Staud, R., Craggs, J. G., Robinson, M. E., Perlstein, W. M., & Price, D. D. (2007). Brain activity related to temporal summation of C-fiber evoked pain. Pain, 129(1–2), 130–142. https://doi.org/10.1016/j.pain.2006.10.010

Steeds, C. E. (2009). The anatomy and physiology of pain. Surgery, 27(12), 507–511. https://doi.org/10.1016/j.mpsur.2009.10.013

Teixeira, M. J., Gemio, W., Teixeira, J., Ciampi, D., Andrade, A. De, Bezerra, S. L., & Okada, M. (2001). Epidemiologia clínica da dor músculo-esquelética. Revista Medicina São Paulo, 80, 1–21. https://doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v80ispe1p1-21

Zhuo, M. (2007). A synaptic model for pain: long-term potentiation in the anterior cingulate cortex. Molecules and Cells, 23(3), 259–271

Manuel Ferreira

Write a Comment